sábado, 25 de maio de 2013

A Escolha...


 "Olhe para os vales para ver a glória do Criador. Toque as flores e sinta a delicadeza dele. Ouça o trovão e escute o poder de Deus. Mas contemple isso - o apogeu - e testemunhe os três... e mais.
  Imagine comigo o que o pode ter acontecido naquele dia.
  Ele colocou uma medida de barro sobre outra até que uma forma sem vida estivesse sobre o chão.
  Todos os habitantes do jardim pararam para testemunhar este evento. Os falcões pairaram. As girafas se esticaram. As árvores se curvaram. As borboletas pousaram em pétalas e assistiram.
  "Você me ama, natureza", disse Deus. "Criei você dessa forma. Você me obedece, universo. Você foi planejado para ser assim. Vocês refletem minha glória, céus, pois foram criados dessa forma. Mas este aqui será como eu. Este aqui será capaz de escolher".
  Todos silenciaram enquanto o Criador voltou-se a si mesmo e retirou algo que ainda não fora visto. Uma semente. "Ela se chama 'escolha'. É a semente da escolha".
  A criação ficou em silêncio e olhou para aquela forma sem vida.
  Um anjo falou:
   - Mas e se ele..
   - E se ele escolher não me amar? - completou o Criador. - Venha, vou lhe mostrar.
 Sem estar preso ao hoje, Deus e o anjo caminharam pelo reino do amanhã.
   - Ali, veja o fruto da semente da escolha, tanto doce quanto amargo.
 O anjo ofegou diante do que viu. Amor espontâneo. Devoção voluntária. Opção pela ternura. Ele nunca vira algo como aquilo. Ele sentiu o amor dos Adões. Ouviu a alegria de Eva e suas filhas. Viu a comida e os fardos sendo compartilhados. Absorveu a bondade e maravilhou-se diante da ternura.
  - O céu nunca viu tal beleza, meu Senhor. Verdadeiramente esta é a sua maior criação.
  - Ah, mas você viu apenas o lado doce. Agora testemunhe o amargo.
 Um forte odor envolveu a dupla. O anjo virou-se horrorizado e proclamou:
  - O que é isto?
 O criador disse apenas uma palavra:
  - Egoísmo.
 O anjo ficou sem fala enquanto passeavam por séculos de repugnância. Ele nunca vira tanta sujeira. Corações apodrecidos. Promessas quebradas. Lealdades esquecidas. Filhos da criação vagando cegamente por labirintos solitários.
  - Esse é o resultado da escolha? - perguntou o anjo.
  - Sim.
  - Eles vão se esquecer do Senhor?
  - Sim.
  - Vão rejeitá-lo?
  - Sim.
  - Nunca mais voltarão?
  - Alguns sim. A maioria não.
  - O que será preciso para que eles escutem?
 O Criador caminhou adiante pelo tempo, muito além, no futuro, até que se colocou ao lado de uma árvore. Uma árvore que seria transformada num berço. Mesmo ali era possível sentir o cheiro da palha que o cercaria.
 Depois de outro passo no futuro, ele parou diante de outra árvore. Ela estava sozinha, imperatriz solitária de uma colina sem folhas. O tronco era grosso, e a madeira era forte. Em breve ela seria cortada. Em breve seria amparada. Em breve seria montada sobre a fronte de uma colina. E em breve ele seria pendurado nela.
 Ele sentiu a madeira esfregando suas costas que ainda não possuía.
  - O Senhor vai descer até lá? - perguntou o anjo.
  - Descerei.
  - Não há outra maneira?
  - Não há.
  - Não seria mais fácil não plantar a semente? Não seria mais fácil não dar a escolha?
  - Seria - disse o Criador calmamente. - Mas remover a escolha é remover o amor.
 Ele olhou ao redor da colina e anteviu a cena. Três personagens pendurados em três cruzes. Braços abertos. Cabeças inclinadas para a frente. Gemiam junto com o vento.
 Homens vestindo roupas de soldados sentados no chão do trio. Jogavam e riam.
 Homens vestidos de religião parados ao lado. Eles sorriam. Arrogantes, convencidos. Eles haviam protegido a Deus, pensavam, ao matar aquele que era falso.
 Mulheres vestidas de tristeza reunidas ao pé da colina. Sem falar. Faces cortadas por lágrimas. Olhos baixos. Uma coloca o braço ao redor da outra e tenta levá-la para longe. Ela não sairia. "Eu vou ficar", disse ela mansamente. "Eu vou ficar".
 Todo céu se preparou para lutar. Toda natureza se levantou para resgatar. Toda eternidade se aprumou para proteger. Mas o Criador não deu o comando.
  - Isso tem de ser feito... - disse ele, e se afastou.
 Enquanto ele voltava no tempo, ouviu o clamor que um dia daria: "Meu Deus! Meu Deus! Por que me abandonaste?" (Marcos 15.34).
 Ele se contorceu diante da agonia de amanhã.
 O Anjo falou mais uma vez:
  - Seria menos doloroso...
 O criador interrompeu mansamente:
  - Mas não seria amor.
 Entraram no Jardim mais uma vez. O Criador olhou sério para a criação de barro. Uma monção de amor formou-se dentro dele. Ele havia morrido por sua criação antes mesmo de tê-la realizado. A forma de Deus reclinou-se sobre a face esculpida e soprou. O pó saiu dos lábios daquele novo ser. O peito se ergueu, rachando o barro vermelho. As maçãs do rosto criaram carne. Um dedo se moveu. E um olho se abriu.
 Mais incrível, porém, que o movimento da carne foi o mover do espírito. Aqueles que puderam ver o invisível respiraram fundo.
 Talvez tenha sido o vento o primeiro a dizer. Talvez o que a estrela viu naquele momento seja o que a fez brilhar desde então. Talvez tenha ficado ao encargo do anjo sussurrar:
  - Ele se parece.. se parece tanto.. com ele!
 O anjo não estava falando do rosto, das características ou do corpo. Estava olhando para dentro - para a alma.
  - É eterno!  - Suspirou outro.
 Dentro do homem, Deus havia colocado uma semente divina. Uma semente de si mesmo. O Deus de poder havia criado o ser mais importante da terra. O Criador havia criado não outra criatura, mas outro criador. E aquele que havia escolhido o amor criou um ser que poderia amar em retribuição.
 Agora, a escolha é nossa."

Trecho do livro: Um dia na vida de Jesus - de Max Lucado.